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Quarta-feira, 23 de setembro de 2020
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Olá!
Depois da Covid-19 e dos protestos antirracistas, mais uma (triste) surpresa pode mudar o rumo da eleição presidencial nos EUA: a morte da juíza Ruth Bader Ginsburg, aos 87, por complicações de um câncer no pâncreas.
Explico como a vaga que ela deixa aberta na Suprema Corte influencia a disputa e indico também três textos para você ficar por dentro do que mais importante aconteceu no primeiro dia dos debates na Assembleia Geral da ONU.
Você pode mandar sugestões, comentários, reclamações e o que quiser para diana.lott@grupofolha.com.br. Eu respondo!
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Nos vemos na semana que vem.
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A juíza da Suprema Corte americana Ruth Bader Ginsburg morreu na sexta-feira (18) deixando um legado memorável e uma bomba eleitoral.
Nomeada em 1993 por Bill Clinton, ela foi apenas a segunda mulher a integrar o tribunal. Sua aprovação no Senado foi um daqueles momentos de união bipartidária que quase não se vê mais nos EUA: recebeu 96 "yeas" e só 3 "nays" —não estou brincando, é assim mesmo que o Senado americano chama os votos "sim" e "não" (teve um senador que não votou).
RBG, para os íntimos, tornou-se ao longo dos anos a juíza mais progressista da corte. Antes de virar magistrada, ela fez carreira advogando em casos de discriminação contra mulheres e minorias.
A Suprema Corte perdeu não só um dos membros que mais influenciou suas decisões nas últimas décadas, mas também um importante símbolo de pautas progressistas, como o aborto e o casamento entre pessoas do mesmo sexo.
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Uma cadeira vazia no tribunal a 46 dias de um pleito decisivo e polarizado é uma oportunidade política valiosa para um presidente que disputa a reeleição. E o cenário atual vem com um bônus: a possibilidade de substituir uma progressista por um(a) conservador(a).
Trump poderá dar de presente ao seu eleitorado um juiz alinhado a seus valores. Mais uma promessa de campanha cumprida. Em troca, votos.
E Trump ganha ele mesmo um presente: aumentando a maioria conservadora da corte de 5-4 para 6-3, ele pode dormir mais tranquilo quando assuntos caros à sua base e a ele mesmo forem a julgamento.
Quais assuntos?, você pergunta. Que tal… o resultado da própria eleição num ano com polêmica sobre a contagem de votos por correio?
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Para entender direito
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O processo de escolha de juiz à Suprema Corte dos EUA é bastante simples.
O presidente indica um nome. O Senado tem liberdade para decidir se leva a indicação em consideração. Se sim, o candidato é sabatinado. A Casa pode parar por aí ou levar a questão a voto. É preciso uma maioria simples (51 de 100) para que o nomeado seja aprovado.
Se for rejeitado, o processo recomeça do zero.
Assim como no Brasil, não existe um prazo para que o presidente faça a escolha, mas o cálculo político neste ano nos EUA apontam para quanto antes, melhor.
Também não existe regra explícita que proíba nomeação em ano de eleição (nem lá, nem cá).
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Para entender os vários debates sobre a sucessão de RBG na Suprema Corte que dominarão o noticiário daqui até a eleição, precisamos voltar àquele longínquo ano, quando Barack Obama ainda era presidente e "House of Cards" ainda era bom.
Em fevereiro, a campanha eleitoral estava a todo vapor, e Trump, ainda pré-candidato, ganhava força. Foi então que o juiz Antonin Scalia, um dos mais conservadores da Corte naquela época, morreu durante suas férias, aos 79 anos.
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Para entender direito (2)
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No Brasil, os ministros do STF são obrigados a se aposentar aos 75, o que permite saber com antecedência quando eles precisarão ser substituídos.
Nos EUA, há um elemento surpresa: os magistrados só deixam a Suprema Corte se decidirem se aposentar —caso de Sandra Day O'Connor, a primeira mulher a integrar o tribunal, que pendurou a toga em 2006— ou se morrerem, como aconteceu com Ginsburg e Scalia.
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Obama já tinha indicado duas juízas durante sua Presidência: Elena Kagan e Sonia Sotomayor (que é o primeiro membro hispano-americano do tribunal). No meio de março, o democrata anunciou a escolha do moderado Merrick Garland para a cadeira de Scalia.
"O presidente não para de trabalhar em seu último ano de mandato. Os senadores deveriam fazer o mesmo", disse ele na ocasião, já dando o tom do que seria o processo de nomeação.
O cenário era este: o presidente era democrata, e o Senado era dominado pelos republicanos. Com a morte de Scalia, a divisão entre progressistas e conservadores na corte ficou 4-4, ou seja, o próximo indicado definiria a bússola ideológica do tribunal. Faltavam cerca de oito meses para as eleições, e Hillary estava à frente nas pesquisas.
Minutos depois do anúncio de Obama, Mitch McConnell, senador republicano por Kentucky e líder da maioria do Senado, mandou uma mensagem diretamente do plenário: os parlamentares não votariam a nomeação de Garland nem o convidariam para a sabatina.
O senador apresentou dois argumentos.
- Obama tinha usado a nomeação para politizar as eleições, já que as chances de seu indicado ser aprovado eram baixíssimas. "Desde 1880, nenhum Senado confirmou uma nomeação feita à Suprema Corte por um presidente do partido adversário durante um ano de eleição", disse.
- A "Regra Biden". Parece ironia, mas é verdade: o nome vem do então vice de Obama, Joe Biden, hoje candidato à Presidência.
Em 1992, quando era senador, Biden afirmou durante uma sessão parlamentar que o Senado não deveria aprovar juízes para o tribunal em um ano de eleição.
"Considerando que a temporada eleitoral está em curso, uma nomeação à Suprema Corte deveria ser adiada até o fim da campanha. Caso contrário, me parece, estaremos correndo grande risco como instituição."
Mas... Não havia nenhuma vaga aberta naquele momento. Biden falava hipoteticamente.
Seguindo essa lógica, McConnell disse que "o povo americano deveria poder se manifestar sobre o futuro da Corte", ou seja: deixando para depois da eleição.
O que também significa, na prática, que a escolha do novo juiz vira plataforma de campanha. "Vote em mim, e a Corte será majoritariamente conservadora" ou "Vote em mim, e a Corte será majoritariamente liberal".
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Resumindo: oito meses é muito perto de uma eleição para votar e aprovar um nomeado e, quando abre uma vaga na Corte em ano de eleição, o correto é aguardar o resultado do pleito para que o vencedor possa escolher quem indicará. Ao menos era assim em 2016.
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Em sua nota de pesar, divulgada no mesmo dia da morte de RBG, McConnell disse, preto no branco, que "o candidato nomeado pelo presidente Trump será votado pelo Senado dos EUA".
E a coerência?, o leitor pode questionar.
O argumento de McConnell é que, agora, tanto o Senado quanto a Presidência são republicanos.
Lembrando que o cenário é este: com a morte de Ginsburg, a Corte ficou 5-3, ou seja, mesmo que o próximo indicado seja liberal, os conservadores continuarão sendo maioria. E faltam só 40 dias para as eleições.
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Dias antes de morrer, RGB disse a uma de suas netas que “seu desejo mais profundo” era não ser substituída antes da posse de um novo presidente, segundo informações da NPR.
Mas os democratas, que têm apenas 45 votos (mais 2 de independentes que normalmente votam com a oposição), estão de mãos atadas.
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Além de agradar sua base, cumprir uma promessa de campanha e formar a Suprema Corte mais conservadora das últimas décadas, Trump já começaria a preparar o terreno para o pós-eleição.
O presidente já deixou no ar que, se perder, talvez não aceite o resultado das eleições. Ele também contestou várias vezes a segurança do voto por correio, que deverá ser amplamente usado no pleito deste ano devido à pandemia do novo coronavírus. E ainda incentivou seus eleitores a votarem duas vezes para testar o sistema.
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Se qualquer um desses temas chegar à Suprema Corte, Trump terá três juízes indicados por ele e uma confortável maioria conservadora, o que, claro, não lhe garante vitórias, mas certamente diminui o risco de derrota.
Não sei se os leitores se lembram, mas não seria a primeira vez que o tribunal definiria uma eleição presidencial. Em 2000, foi uma decisão da corte que cancelou a recontagem manual dos votos na Flórida e deu a vitória ao republicano George W. Bush (e a derrota a Al Gore).
Naquele julgamento, RBG foi contra o entendimento da maioria. "Eu discordo", escreveu ela em seu voto dissidente, quebrando o protocolo judicial que pedia que um "respeitosamente" sempre acompanhasse a expressão.
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Na terça (22), tivemos o primeiro dia de debates na Assembleia Geral da ONU. Indico três textos para você não ficar boiando: o discurso do presidente Jair Bolsonaro devidamente checado e contextualizado; uma análise do repórter especial Igor Gielow sobre o que o discurso significou e os highlights da participação da China, observada de perto neste ano por causa da pandemia e da crise na relação com os EUA.
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A curiosa história do ruandês que salvou centenas durante o genocídio, virou motorista de táxi, ativista de direitos humanos, opositor do governo de seu país, e agora preso (político?) por terrorismo.
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Ficamos por aqui. Até a semana que vem!
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